Comparação entre livro e filme – Call me by your name

Call me by your name, ou Me chame pelo seu nome aqui no BR (ou ainda CMBYN pra facilitar), é uma pancada emocional sem precedentes. Você entra no cinema achando que está apenas indo ver um filminho como outro qualquer, e sai com a cabeça totalmente abalada e a vida revirada de cabeça pra baixo. Algo em mim mudou depois de ver esse filme e se você veio até aqui é porque algo mudou em você também. É como se aquele momento de catarse que o filme proporciona ficasse pra sempre em nós e não acabasse como acabaria ao fim de algum outro filme normal. O jeito como a história é escrita e encenada consegue nos colocar na pele do Elio; passamos a ser o Elio e talvez por isso o impacto emocional seja tão avassalador: tudo o que dói nele dói em nós também.

Saí do cinema tarde da noite, mas no dia seguinte fui imediatamente na primeira livraria comprar o livro. Li em 2 dias, mas teria lido numa tacada só se não tivesse que trabalhar. Depois do livro terminado, mais uma sessão de cinema pra ver o filme (dessa vez sob a ótica das emoções narradas e aprofundadas no livro), e o que parecia impossível aconteceu: o filme conseguiu ficar ainda melhor.

Como prometido, vou fazer uma comparação entre o livro e filme mostrando o que muda entre um e outro, o que é mais explicado e aprofundado no livro e não é tão bem explicado no filme, e também vou falar sobre o final do livro que não é o mesmo final do filme. Mas vou sinalizar antes de chegar em cada etapa, então fique tranquilo caso você não queira ler, vai conseguir parar a tempo! A partir daqui vai ser zona de spoilers total, é claro!

O livro não segue muito bem uma ordem cronológica pois é narrado em primeira pessoa, na voz do Elio, e ele narra enquanto lembra dos acontecimentos daquele verão. Por isso acho que o Oscar de melhor roteiro adaptado seria super justo aqui, achei bem difícil transformar uma história dessa em filme já que o livro é totalmente passado dentro da cabeça do Elio e no filme não entramos tanto nos pensamentos dele assim. Tirando esse fato, o filme é bem fiel ao livro com algumas poucas coisas que ficaram de fora e poucas cenas levemente modificadas que explico abaixo.

Vamos em tópicos pra ficar didático:

_Da chegada do Oliver até o primeiro beijo:
Durante todo esse momento desde que o Oliver chega até o Elio de fato se declarar, rola uma obsessão da parte do Elio em relação ao Oliver. No filme isso não fica tão claro e parece até que o Elio não sabe muito o que sente por ele e hesita em relação aos próprios sentimentos. Mas no livro fica bem clara a paixão dele pelo Oliver quase desde o exato momento em que ele chega na casa, e isso é mostrado em vários, váaarios trechos quase repetitivos em que o Elio narra tudo que ele gostaria que o Oliver fizesse com ele, no melhor estilo “me joga na parede e me chama de lagartixa”.

O texto é sempre muito literal e direto, carregado de desejo. Uma coisa muito especial do livro e que perdemos no filme, é que o livro mostra todas as hesitações do Elio em cada mínima atitude. Ao falar com o Oliver na piscina, no café da manhã, ao sair de bicicleta com ele por aí, ele está constantemente pensando “mas e se ele não gostar de mim? será que ele entendeu meus sinais? será que aquilo que ele falou foi um sinal? será que mando um bilhete? será que apareço no quarto dele?”. Com todas essas hesitações nós vamos ficando noiados igualzinho ao Elio e por isso o momento em que ele finalmente se declara é de um alívio imenso. Parece que éramos nós que estávamos com aquela pergunta entalada e precisávamos colocar pra fora. É melhor falar ou morrer? Falar, é claro!

Outra coisa que não fica muito clara no filme é que eles tinham uma amizade muito forte mesmo e saíam juntos tooodos os dias pra nadar ou andar de bike. Acordavam cedo tipo 6h da manhã e iam nadar ou pedalar e só na volta tomavam café. Dali em diante cada um ia fazer suas tarefas diárias e no fim da noite as vezes se encontravam nas festinhas ou bares da cidade. Por muitas e muitas vezes o Elio ficava em casa tenso que o Oliver tinha sumido a noite inteira e imaginava mil coisas tipo, que ele estava pegando todas as mulheres da cidade. Achei que o filme poderia ter mostrado um pouco mais dessa proximidade pra não parecer que a paixão do Elio foi de graça ou apenas pela aparência física de deus grego do Oliver, mas sim que eles realmente tinham muito em comum nos gostos por livros, músicas, artes e esportes.

_Diferença de idade
No filme colocaram um ator de 30 anos, Armie Hammer, contracenando com um de 21 anos, o maravilhoso Timothée Chalamet que faz o Elio. É uma diferença de idade de 9 anos ao invés dos 7 anos que os separam no livro, onde o Elio tem 17 e o Oliver 24. O problema é, Timothée Chalamet parece ter 17 anos mas Armie Hammer parece ter bem uns 35. A diferença então aparenta ser um pouco maior do que deveria ser, não que isso seja um problema mas não é muito fiel ao livro e levanta questões que não precisavam ser levantadas. Amei o Armie Hammer no papel de Oliver mas acho mesmo que poderiam ter escolhido um ator com aparência de um pouquinho mais novo.


-Gay, Bi, Fluido?
No filme não é discutida essa questão se eles são gays ou bi ou seja o que for. Isso não parece ser o problema que está tirando o sono do Elio. Ele está apenas desesperado pra saber se o Oliver gosta dele e essa é a única problematização que marca toda a primeira parte do livro até o primeiro encontro dos dois. A partir daí sim surgem algumas questões no livro que são discretamente mostradas no filme. Quando o Elio fica meio distante e frio com o Oliver nas cenas depois da primeira noite juntos, pra mim não tinha ficado muito claro o motivo. No livro ele passa 4 páginas narrando que se sentiu com aversão de si mesmo, com culpa, com remorso do que tinham feito e até meio “dolorido”, pois essa tinha sido a primeira relação homossexual dele e logo depois dela vieram todos os questionamentos se aquilo era a coisa certa a fazer. Ele menciona até que as dores o faziam pensar o quanto aquilo era errado. Vontade de pegar no rostinho dele e falar meu anjo, quanta dor as mulheres sentem nas relações sexuais com homens e isso não tem nada a ver com estar fazendo a coisa errada ou a coisa certa. Mas sim, ele fala isso no livro e por isso fica meio distante do Oliver depois da transa, querendo ficar sozinho pra pensar se é aquilo mesmo que ele quer.

Sobre as relações com outras mulheres o Elio não parece ter ciúme do Oliver com as outras, o ciúme consiste mais em que ele gostaria de estar com o Oliver naquele momento, ele quer estar com o Oliver o tempo todo e não pode porque o Oliver está com outra pessoa. Então não é um ciúme pelo fato do Oliver transar com outras mulheres. Porque ele também transa com a Marzia e gosta muito. O que no filme parece uma transa forçada só pra matar o tempo, o desejo e tentar tirar o Oliver da cabeça, no livro ele narra muito bem que adora estar com a Marzia e sente muito prazer com ela no sexo. Em um momento do livro ele diz “acredito que o Oliver não ficaria chateado com isso afinal padeiros e açougueiros não competem”. Ou seja eles parecem lidar bem com o fato que ambos também saem com mulheres.

Sobre as relações anteriores é dito no livro que o Elio nunca se relacionou com homens antes mas já tinha transado com outras mulheres, ele não era virgem quando transou com a Marzia. Porém 3 anos antes um rapaz em Roma tinha passado por ele, apertado seu ombro e o convidado para ir no cinema. Nesse momento Elio sentiu pela primeira vez tesão por homens. Mas por medo ou timidez ele não aceitou o convite do rapaz romano e ficou nisso mesmo. Já sobre Oliver não sabemos nada a respeito disso nem mesmo no livro é explicado se ele já tinha se relacionado com outros homens. Pela “segurança” que ele demonstra na hora da transa parecia sim que ele já tinha tido essa experiência mas nada que tenha ficado claro. Já com mulheres é falado no livro que ele tinha pego geral, tipo a cidade inteira mesmo rsrs.

Ou seja aparentemente o Elio é bissexual já que sente real prazer e atração por mulheres e homens mas o Oliver pode ser que fique com mulheres por causa da pressão da sociedade como ele diz no final do filme “meu pai me mandaria para um reformatório se soubesse”. Como o livro não nos fala sobre os pensamentos de Oliver não temos como saber se ele realmente gosta de mulheres ou se optou por se relacionar com mulheres por fachada. Mas o legal do filme é que isso não importa pois realmente não deveria importar, não deveríamos nos preocupar em enquadrar as pessoas em alguma orientação sexual assim ou assado e nesse ponto o filme é brilhante ao derrubar essa barreira.

_”Me chame pelo seu nome”
A frase pode ter parecido meio sem sentido à primeira vista mas tem uma profundidade que mano do céu. No livro mostra o quanto os dois personagens se sentem tão atraídos um pelo outro a ponto de quererem ser o outro. Em dado momento eles começam até a usar as cuecas e roupas um do outro. O desejo é tamanho que eles querem estar na pele do outro, se sentir como o outro se sente, viver a vida do outro. Um passo além muito mais profundo e poético que o manjado “quero você dentro de mim”. “Quero ser você” virou na poesia de Aciman “me chame pelo seu nome”, frase poderosa que já nasce clássica.

_Cena do pêssego
A profundidade que essa cena tem no livro é algo que eu não poderia imaginar. Depois do incômodo momentâneo ao assistir a cena fui ler essa parte do livro esperando que ele pudesse me justificar um pouco melhor a necessidade dessa cena. Fiquei sabendo então que o pêssego que o Elio pegou inocentemente para comer, começou a lembrá-lo da bunda do Oliver enquanto ele estava deitado na cama pensando na noite anterior. Logo ele fica excitado e, por que não, se masturbar usando o pêssego imaginando a bunda do Oliver? Quando o Oliver chega e o pega totalmente de surpresa, entende tudo e resolve comer o pêssego que estava gozado (!). O Elio fica perplexo com isso e sente uma vontade incontrolável de chorar. É aqui que começa a poesia. Ele pensa que ninguém nunca tinha sido tão gentil com ele. Exceto Anchise (um dos funcionários da casa) que chupou uma vez o veneno de um escorpião do seu pé. Mas aquilo era diferente, o Oliver queria levar uma parte dele consigo. E mais do que isso, queria demonstrar o quanto ele estava apaixonado pelo Elio. Ele diz ao Elio que era melhor isso que palavras e que dessa forma o Elio nunca duvidaria do que ele sente e sempre poderia lembrar que isso aconteceu. O Elio pensa que se aquilo tivesse acontecido no calor do momento em uma transa seria diferente, mas ali num momento em que os 2 estavam apenas conversando realmente foi um impacto muito forte e uma demonstração de gratidão que ele nunca tinha visto antes. Que babado!

Repararam como o início do arco dessa cena quando ele pega o pêssego na árvore super remete à adão e eva pegando o fruto proibido? Palmas Luca Guadagnino!

_Cenas que ficaram diferentes no filme

Tirando o fato de que o livro dá mais profundidade a cada cena que vemos no filme, os acontecimentos são praticamente iguais com pequenas alterações.

Conta no banco: No filme não entendemos bem porque o Oliver insiste em abrir uma conta no banco se ele vai ficar tão pouco tempo na Itália. Mas no livro é dito que ele abre a conta porque gosta de apostar no pôquer e vai quase todas as noites jogar. O Elio demora pra descobrir isso e por um tempo fica achando que ele saía tanto a noite pra ficar com mulheres.

Quando Elio se declara: No livro eles estão sentados juntos na praia observando o mar quando o Elio assume os sentimentos por Oliver… “You know what things…” essa frase não sai mais da minha cabeça… mas no filme fizeram eles conversarem ao redor de uma praça com um monumento da primeira guerra no meio. Eles rodeiam o monumento enquanto conversam e isso é uma analogia maravilhosa à guerra interna que eles estão vivendo pra assumir esses sentimentos. Assim que ele fala e coloca isso pra fora a guerra passa e eles ficam frente a frente do outro lado da praça. Quem notou isso foi o crítico Raphael PH do Youtube. Muito bem notado, PH!

“Você vai me matar se parar”: Essa frase é dita no filme um pouco diferente quando o Oliver está massageando os pés do Elio e ele diz “você vai me matar se continuar”. Mas no livro o Elio tinha um sonho recorrente de que eles estavam transando e o Oliver dizia repetidamente “você vai me matar se parar”. O filme deu uma abrandada boa nessa cena, que seria bem picante se rolasse, né!

Vimini, a menina com leucemia: Vimini é uma criança de 10 anos que mora perto da casa dos Perlman e tem leucemia. Ela e Oliver saem todos os dias pra andar na praia e desenvolvem uma linda amizade. Quando Elio volta depois de se despedir de Oliver na estação, Vimini conversa com ele demonstrando que sabia da relação deles e diz “você pelo menos ainda pode encontrar com ele de novo, eu não”. De fato ela morre e não encontra com ele de novo. Triste! Não entendo muito o propósito dessa personagem no livro e acho que justamente por não ser de muita importância ela ficou de fora do filme, mas me parece que seria pra mostrar que o Oliver cativa todas as pessoas independente de sexo e idade. O filme deixa isso claro quando o Elio diz pra mãe “quem não gosta do Oliver?”.

Marzia: No filme, Marzia tem toda aquela compreensão mágica de tudo o que o Elio está passando e perdoa o Elio por ter esquecido dela sem que ele nem precisasse pedir perdão. No livro isso não acontece porque o Elio nunca deixa de ficar com ela, ou seja, não magoa nem despreza ela. Durante todos os dias em que ele fica com o Oliver de noite ele também fica com a Marzia de tarde. Inclusive no dia da primeira noite do Elio e Oliver juntos, o rolê começa no lance do bilhete, aí ele transa com a Marzia de tarde enquanto espera a meia noite chegar pra encontrar o Oliver, depois transa com o Oliver de noite, depois acordam e vão nadar, depois voltam e o Elio transa novamente com a Marzia pela manhã, depois transa com o pêssego de tarde e depois novamente com o Oliver de noite. Que rolê, meu Brasil brasileiro! Tem 17 anos mesmo o rapaz, né. Rsrs

Viagem juntos à Roma: No livro eles viajam juntos pra Roma e não pra uma cidadezinha pequena perto de Milão como é mostrado no filme. E isso faz toda diferença pois em Roma eles vivem 3 dias de uma efervescência cultural única indo a coquetéis e jantares com escritores e artistas super liberais e doidos, coisa que não existe na cidadezinha pequena que eles vão no filme. Elio fica maravilhado com aquele mundo que se abre diante dele, tanto pelo aspecto cultural quanto pela liberdade sexual das pessoas que ele conhece. Ele começa a se sentir excitado e atraído por homens e mulheres de diferentes idades em Roma e sente que está vivendo os melhores dias da sua vida junto com o Oliver nessas festas. Quando Oliver parte da estação Termini em direção ao aeroporto, Elio volta dali de trem pra Bergamo, a cidade onde fica a casa dos pais, ou B. como o autor chama durante todo o livro. O empregado Anchise o busca na estação Clusone. Já no filme fizeram a despedida dos 2 já ser nessa mesma estação Clusone, pois eles não tinham ido até Roma e estavam numa cidade próxima de casa. Dessa forma puderam fazer com que Elio pedisse para a mãe buscar ele o que foi fundamental para nos presentear com uma das cenas mais tocantes de todo o filme, pois além de emocionante pra cacete ainda traz a mãe para participar desse momento de coração partido que ele estava vivendo, e mostra que apesar de ter vivido os últimos dias como adulto descobrindo a sexualidade e se aventurando por uma nova cidade, ele ainda era um adolescente que precisava do colo da mãe. E quem não precisa? É uma cena muito poética e o show de interpretação que o ator dá desde o momento que ele liga pra mãe até dentro do carro e quando chega em casa e conversa com o pai é de cair o ku da bunda. QUE ATOR. Se não ganhar o Oscar nem acompanho mais essa palhaçada de Oscar!

httpssss://www.youtube.com/watch?v=7H1xgGfLqLE

Além disso, uma coisa que achei muito importante é que em Roma ele dá nome a todas as ruas e todas as praças por onde eles andaram juntos, coisa que antes no livro ele não cita nem o nome da cidade em que ficava a casa de verão dos pais (em algum lugar da Itália, é como o filme começa). Minha interpretação disso é que antes do Oliver pouco importa onde ele estava nada era muito marcante, e com o Oliver cada momento da vida dele passa a ter nome, sobrenome, e data, marcados a ferro e fogo nas lembranças dele. Ele diz em dado momento que queria levar o Oliver em cada canto que ele adora de Roma pra que esse lugar passe então a ser um lugar em que ele esteve com o Oliver e não um lugar qualquer. Inclusive levou o Oliver na rua em que o menino de bike tinha tocado em seu ombro e ele tinha entendido que também sentia atração por homens a partir daquele momento. Para que aquela rua passasse a ser a rua do Oliver e não a rua do garoto da bike. Poderoso né? Foi essa frase que corroborou a minha tese de porque o autor não dava nome aos lugares antes e passou a dar depois. Além disso uma coisa muito legal que o Elio narra no livro é que todos os cheiros, cores e paisagens que antes eram coisas tão comuns que ele já tinha vivido em todos os verões da sua vida agora pertenciam aos momentos em que ele estava com o Oliver. Isso não é muito verdadeiro? De repente um lugar que você sempre foi se torna o lugar mais especial do mundo porque você esteve nele com o seu crush e então tudo lá passa a remeter ao crush. Mais uma vez Aciman dando show em entender a natureza das paixões humanas.

Toda essa participação que a mãe tem no filme é diferente no livro, não é ela que lê aquele trecho do livro alemão, é o próprio Elio que lê o livro sozinho. Não é ela que sugere que eles viagem juntos e nem é ela que busca ele na estação como já falei. Mas achei muito legal que o filme tenha dado pra mãe um papel mais participativo nessa aventura emocional do Elio. Até porque, que atriz linda e que personagem poderosa é essa mãe hein? Aquele olhar dela de “vcs acham que eu sou trouxa mas eu tô entendendo tudo” é o melhor!

_Diálogo do pai
Ponto alto do filme, o diálogo do pai é colocado integralmente igualzinho como está no livro. Mas fica aqui a pergunta, o pai do Elio é gay? Quando vi o filme não achei que o diálogo deixava isso claro, pra mim soou apenas como “nunca me entreguei às paixões que tive e me arrependo disso”. Mas vi algumas pessoas interpretando como “nunca assumi que sou gay e nunca vivi isso, por isso te entendo tanto e quero que você viva isso intensamente”. Bom realmente não sei, pra mim acho mais interessante que ele tenha toda aquela compreensão e aceitação com a orientação sexual do filho sendo ele próprio hetero, pois se ele for gay é mais fácil entender o filho. E eu gostaria que justamente essa compreensão toda viesse de um pai hetero. Mas se ele for gay também é impactante ver ele dizendo ao filho que não pôde assumir e vivenciar isso mas que estava feliz pelo filho poder. De qualquer forma é um diálogo perfeito e maravilhoso e não consigo lembrar de nenhum diálogo mais importante em toda a história do cinema. E você, acha que o pai é ou não é gay?

Algumas pessoas disseram também que quando o Elio pergunta “você acha que a mamãe sabe?”, ele está se referindo se ela sabe que o pai é gay. Não minha gente, ele pergunta se ela sabe sobre ele e Oliver mesmo, porque no livro quando ele pergunta isso o pai responde “não acho que sua mãe saiba mas tenho certeza que a atitude dela não seria diferente da minha”. Ou seja estão falando sobre a atitude dela em relação à aceitação de Oliver e Elio, então não, a pergunta não é se a mãe sabe que o pai é gay mas sim se sabe sobre a relação dele com Oliver.

_Final do livro
Entrando aqui na zona de spoilers pós filme já que o filme acaba no momento em que eles se despedem naquele verão, mas no livro temos mais alguns encontros nos próximos 20 anos da vida deles. Como o filme vai ter continuação algumas pessoas não estão querendo saber esse finalzinho do livro pra não saber os spoilers MAS a continuação do filme vai ser diferente do final do livro como já foi falado pelo diretor. Ou seja, se você não ler o final do livro talvez nunca saiba como foi porque o filme será diferente. Até porque não daria pra fazer mais 2 filmes como o diretor quer com apenas essas 20 páginas de epílogo. Fiquei muito feliz com o anúncio de mais 2 filmes e novas narrativas sobre a vida futura deles. Algumas pessoas disseram que é um absurdo e que o filme acaba perfeitamente onde tem que acabar mas não concordo. A vida dos 2 vai avançar no futuro, eles não morreram naquela despedida certo, eles vão envelhecer e vão chegar num momento de redes sociais que vivemos hoje. Como é que eles vão passar ilesos pelos próximos anos sem nem dar uma olhadinha no perfil do face do outro pra ver como o outro está? Quem nunca olharia? É praticamente impossível que um reencontro nunca aconteça, ainda mais quando adentramos na era digital. Ou seja, faz sentido total que haja esse reencontro e já estamos desesperados pra saber como será. No livro esses reencontros são deprimentes e tive que ler várias vezes pra acreditar que era aquilo mesmo… mas espero que o filme faça jus à paixão maravilhosa vivida nesse verão e nos traga um remember digno de respeito.

Vamos então ao epílogo do livro:

Após se despedir de Oliver, Elio volta pra casa sozinho de trem e Anchise o busca na estação. Não tem aquele chororô todo na despedida nem no carro com a mãe. Não narra no livro essa dor tão profunda que no filme fica muito mais gráfico e evidente. Em parte porque o Elio já vinha se preparando muito para essa despedida tentando imaginar a casa sem o Oliver mesmo quando o Oliver ainda tava lá. E quando ele volta pra casa ele pensa “quarto sem o Oliver, piscina sem o Oliver, café da manhã sem o Oliver, tudo conforme eu já previa.”

Eles mantém contato por telefone e Oliver volta no natal, ou melhor no hanukkah, 6 meses depois, “conforme prometido”, ou seja eles já tinham marcado essa volta quando se despediram e talvez por isso a despedida no trem, no livro não foi tão dolorosa. Por isso também Elio estava felizinho da silva ouvindo seu walkman no hanukkah. Afinal era quando ele iria reencontrar o Oliver, o que no filme não fica tão claro e ele atende o tel com surpresa ao ver que era o Oliver. Já no livro aquele diálogo sobre o casamento não acontece no tel e sim pessoalmente, o Oliver vem pra passar o fim do ano com eles e ao chegar fica frio e distante com o Elio, como ele ficava no início do relacionamento quando eles ainda não sabiam dos sentimentos de um pelo outro e ficavam só se alfinetando. Elio não toma nenhuma atitude só fica meio chocado com a frieza dele, e então em uma das noites, o Oliver vai até o quarto dele e conta que vai casar. Depois disso apenas eles se beijam mas sem aquela paixão de antes e o Oliver volta pro quarto. O Elio fica bem puto das ideia e lança um olhar matador pro Oliver mas ele diz apenas desculpa não posso fazer isso. PASSADA!

9 anos depois (!!!), Oliver mantém uma super relação de amizade com os pais de Elio e faz uma visita à casa da Itália levando os filhos pros pais do Elio conhecer. O Elio nessa altura mora nos EUA numa cidade a 80km de distância apenas do Oliver (e nunca foram se encontrar!!). Pelo que eu entendi um sabe mais ou menos sobre a vida do outro através dos pais do Elio que são quem mantém a amizade com Oliver. Quando Oliver chega na casa com os filhos, os pais do Elio ligam pra ele que está nos EUA e põe o Oliver no telefone com ele. O Elio chama então o Oliver de Elio, como na brincadeira deles, e o Oliver NÃO CORRESPONDE, o que me deixou muito brava. No livro o Elio pensa que ele tinha esquecido da brincadeira mas eu acho que o Oliver apenas não quis corresponder mesmo.

Mais 4 anos se passam e Elio está de passagem a trabalho pela cidade onde o Oliver vive e resolve ir lá na universidade que ele dá aula. Assiste a uma aula dele e no final vai falar com ele. O Oliver NÃO RECONHECE ELE (sério gente, isso é possível?) só reconhece depois de um tempinho olhando pra ele. Nesse momento fazem 15 anos que os 2 não se viam mas o Oliver tinha visto fotos do Elio que os pais tinham mostrado. Ok. O Oliver convida então super animado o Elio a visitar sua casa e conhecer sua mulher e seus filhos. Não amado, o Elio não quer conhecer sua mulher e seus filhos né Elio? Li esperando que o Elio desse essa resposta. E felizmente era isso mesmo. O jeito que ele explica porque não quer conhecê-los é maravilhoso e eu não conseguiria reproduzir aqui. Mas ele resume no final assim:

– Não posso ir conhecer sua família porque talvez eu nunca tenha superado.

E o Oliver ao ouvir isso responde

– Que pateta!

Tá entendendo gente como o Oliver sempre debocha do sentimentalismo do Elio? Esse “que pateta” é o mesmo “don’t be a kid” daquele bilhete lá. Pode ser apenas a forma como ele próprio, Oliver, lida com os próprios sentimentos, não deixa de sentir mas também não leva os sentimentos tão a sério, não aprofunda demais nem demonstra demais. De qualquer forma é muito confortável pro Oliver fazer uma piada em relação aos sentimentos do Elio, não foi ele que sofreu igual um macaco com ebola tentando escalar o Everest sem oxigênio artificial. Ou será que sofreu? Se sofreu nunca vamos saber porque ele nunca vai dizer. Então pra todos os efeitos, não sofreu.

Bom, nesse encontro eles saem pra beber num bar e passam a noite toda conversando. A conversa é bem profunda e impossível de reproduzir resumidamente. Eles relembram tudo o que viveram e falam sobre suas vidas atuais. Mas o que mais me marcou foi o Oliver dizendo que a vida dele sem o Elio, com a mulher e os filhos, “era como um coma, ou melhor, uma vida paralela”, e que quando via o Elio ali na frente dele era como se acordasse do coma. Conforme a conversa vai se aprofundando nesses termos e eles vão bebendo, o clima vai esquentando e os olhares ficando mais profundos. Então eles decidem ir embora cada um pra sua casa pra não fazer o que não devem e é isso, se despedem e tchau. Tá bom pra você?

Mais 5 anos se passaram, agora sim 20 anos após aquele verão, e o Oliver volta a casa da Itália, dessa vez sem os filhos (amém né). Eles combinaram esse reencontro por email mas não fica claro quem procurou quem. O Oliver chega apenas para passar uma noite, pede para ficar no mesmo quarto, eles revisitam todos os lugares ao redor da propriedade em que eles sempre se divertiam, a piscina, a praia, os terrenos e estradinhas abandonados ao redor, e especialmente os lugares onde as cinzas do pai do Elio foram jogadas, sim, ele morreu, mto mto triste!

Aí fica um clima meio fúnebre eles falando das pessoas que morreram, Sr. Perlman, Vimini, Anchise, ficam relembrando os cantinhos da casa em que mais gostavam de ficar e o Oliver diz “me lembro de tudo, eu sou como você”. Ou seja, essa frase “I remember everything” que o Oliver fala no tel pro Elio no final do filme é dita no livro só 20 anos depois quando ele retorna na casa.

Então ao ouvir isso o Elio PENSA, e não fala, apenas pensa, “se você gosta mesmo de mim então, antes de ir embora amanhã e nos despedirmos para sempre, me pegue pelo rosto e me chame pelo seu nome como você fez naquela vez.”

E ACABOU O LIVRO DESSA MANEIRA PESSOAL.

AHHHHH!! Ai gente me desculpe mas quem achou que isso foi um bom final favor explicar aí embaixo porque eu achei trevas total!

-Minha fanfic
hahaha ah eu não poderia deixar de pensar em como eu gostaria que essa história dos dois se desenrolasse no futuro. Pra mim ou o babado devia ter acabado ali mesmo e eles nunca mais se falassem pois o Elio podia guardar um rancor pelo Oliver não ter optado por assumir a relação com ele… ou então se rolasse um remember anos depois que fosse aquele remember que vc respeita! Se não for pra rolar um fight durante esse remember eu não saio nem de casa né mores. Por outro lado vocês lembram do filme Benjamin Button em que eles se encontram anos depois e rola um sexo BEM do estranho e talvez até um arrependimento de ambas as partes meio deprimente? Se for assim então melhor manter apenas as memórias da juventude mesmo e deixar o fight pra lá. O que eu não me conformo é, eles eram ainda muito jovens no último encontro, 20 anos depois eles tinham 37 e 44 anos, os filhos do Oliver já estavam crescidos… já eram os anos 2000 e a aceitação da sociedade com homossexuais já estava caminhando pra uma boa melhora. Então não vejo porque aqui eles não terem finalmente abraçado essa relação e vivido de novo essa paixão ficando juntos de vez. Esse seria meu final perfeito mas quem sou eu né? Acredito que o Aciman sabe o que está fazendo e estou confiante num final feliz para os próximos filmes.

-Minha opinião pessoal sobre Oliver
Cada pessoa que conversei me falou uma visão diferente do Oliver. Alguns acharam que ele super se entregou à paixão, outros acharam que ele era apenas um babaca que se alimentava da admiração do Elio. Eu achei um misto das duas coisas, achei que o Oliver tem traços de transtorno narcisista pois é ele quem está, e faz questão de estar, sempre no controle daquela relação, é ele quem sempre está com a bola, porém também tem alguns momentos de demonstração e entrega total como na cena do pêssego. Mas, em um único momento em que o Elio “pega a bola”, e começa a ficar distante dele, e é a única parte de toda a história em que o Elio demonstra alguma hesitação em relação ao que sente pelo Oliver, aí o Oliver vai lá chupar o cara pra ver se ele ainda se excita e depois BATE A PORTA NA CARA DELE E DEIXA ELE NA PISTA. QUE-BABAQUICE-MEU-DEUS. Deixa a porra do menino ficar um minutinho com a bola meu anjo, dá pra ser? Mas não, o narcisista nunca permitiria isso. Toda a força e autoconfiança do Oliver consistia justamente em ser admirado, em ter a certeza que era admirado pela cidade inteira e pelo Elio. No único momento em que ele perde isso sua expressão muda, é a única parte do filme em que o Oliver perde a expressão de super-homem auto confiante e fica “à mercê” das próximas atitudes do Elio, e o ator Armie Hammer foi PERFEITO em atuar essa mudança no olhar do Oliver, deixando toda a sua insegurança vir à tona.

Todo mundo que viu friends entende perfeitamente o que eu estou chamando de bola aqui né, Rachel explica:

httpssss://www.youtube.com/watch?v=d1CF__LTewo

É triste ver como o Oliver usa uma manobra suja pra “recuperar a bola” e o Elio cai direitinho, tadinho, ele estava apaixonado e nunca ia esperar levar aquela portada na cara. Mas nisso fica claro o quanto na verdade o Oliver é frágil por dentro pois toda sua força está apoiada na certeza da admiração do outro, sempre com seus “Later!”, ou “Don’t be a kid”, ou “Que pateta”, sempre encerrando a interação na hora que ele bem entende e deixando o Elio lá em modo stand by, porque ELE TEM A CERTEZA QUE O ELIO FICARÁ LÁ NO STAND BY NÃO IMPORTA O QUE ELE FAÇA. O Elio dá até uma zoada nisso quando eles estão na praça da primeira guerra e fala “você sabe que eu não vou a lugar nenhum”, o que eu entendi como “você sabe que eu estou a sua disposição e é você quem manda”.

Ou seja, pra mim o Oliver é meio babaca sim e achei muito estranho quando no final do filme o pai dele fala “o Oliver é bom, e você também é bom” e ele responde “eu acho que ele é melhor que eu”. Oi? Não meu anjo, você é muito melhor. Você é de verdade, você é sincero, você fala o que pensa, você põe as emoções pra fora, você não vive pras aparências. Algumas pessoas disseram pra mim mas Ana, pro Elio é muito mais fácil admitir tudo o que sente e se jogar nessa relação porque ele vive num ambiente de aceitação e o Oliver não. Ok concordo, mas isso não justifica que o Oliver seja (quase) sempre frio e dominante com o Elio quando eles estão entre eles sem ninguém olhando, o que ficou evidente com a portada na cara. Não admitir os sentimentos reais dele frente a sociedade eu entendo mas fazer questão de ter o controle da relação e deixar o Elio sempre em stand by não tem nada a ver com a pressão da sociedade, é apenas o narcisismo dele dando as caras. É só a minha interpretação tá gente, nesse ponto cada um tem a sua, mas realmente é difícil pra mim entender uma personalidade como a do Oliver porque eu sou o exato oposto. É difícil não ver má fé numa atitude que se eu fizesse seria por má fé.

Momento fika a dika:

Pessoal, tenho visto muitas pessoas falando ah meu deus queria ter esse romance, ah meu deus não sinto isso pelo meu namorado, ah vou terminar, ah cadê meu Oliver. Calma pessoal. Primeira coisa, essa é uma história de PAIXÃO, não de amor. E as paixões elas PASSAM. O que vc prefere, viver 10 dias de paixão e nunca mais ver a pessoa porque ela preferiu se casar com outra pessoa, ou viver uma paixão plenamente que vira amor que vira cachorrinhos que vira filhos que vira viagens pelo mundo? Vamo combinar que a segunda opção é bem mais maneira né? Essa história é linda tudo bem, mas vamos valorizar a coisa certa na vida, porque se dar bem por 10 dias com alguém é muito mais fácil que se dar bem por 14 anos, como eu me dou com o meu arroba por exemplo.

Outra coisa pessoal, não vai ver esse filme e querer voltar a falar com o crush embuste antigo como eu tô vendo muita gente fazendo. Embuste é embuste e deve ficar no cemitério dos embustes da onde eles jamais deveriam ter saído. Pense que nessa história, apesar de eles não ficarem juntos no final, o Oliver realmente correspondeu à paixão pelo Elio, pelo menos durante aquele momento. Se seu ex te deu o pé de forma escrota, se passou atestado de embuste, então não, ele não é o Oliver da sua vida. Melhor não pagar paixão pra ninguém do que pagar paixão pra pessoa errada né mores?

 

Ufa… Como é bom falar dessa história… Espero que esse vício passe algum dia!

E você, conta pra mim o que achou? Conversa comigo? Estou 10 reais mais carente e 50 reais mais emotiva ultimamente depois que vi esse filme. Preciso ver um bang bang urgentemente pra voltar ao estado letárgico que mantém a paz no meu coração.

Até mais, pessoal!

Post Author: Ana Campos

6 thoughts on “Comparação entre livro e filme – Call me by your name

  • Ju Wallauer

    (14 de fevereiro de 2018 - 23:38)

    Que tiro foi esse? Gata eu tava erradíssima, puta da minha cara sem entender como um relacionamento tão legal quanto o dos pais do Elio foi destruído so com uma frase: Mamae sabe? nao, ela é uma otaria, enganei ela a vida toda. Tava inconformada. Obrigada por essa luz. Amei o texto e as análises. <3

  • Sidney

    (27 de fevereiro de 2018 - 07:37)

    MARAVILHOSA COMPARAÇÃO! PS EU ODEIO MUITO ESTE GRANDESSÍSSIMO FILHA DA PUTA QUE É O BABACA HONORIS CAUSA QUE É O OLIVER! EU JÁ NÃO GOSTAVA TANTO DO ARMIE HAMMER – AGORA QUE A ARTE IMITOU A VIDA – SE EU VER ESTE TROPEÇO NA RUA EU QUERO ELE NO MEIO! TO AMANDO SEU SITE GATA!

  • Sidney

    (27 de fevereiro de 2018 - 08:05)

    Oi? Não meu anjo, você é muito melhor. Você é de verdade, você é sincero, você fala o que pensa, você põe as emoções pra fora, você não vive pras aparências.AHAZOU HUMILHOU PISOU <3

    • Ana Campos

      (27 de fevereiro de 2018 - 16:37)

      hahahaha obrigada Sidney volte sempre aqui também adoramos você 😉

  • Ricardo

    (26 de abril de 2018 - 06:31)

    Amei a forma como fez a comparação e, principalmente por ter ido até o final do livro. Beijos.

  • bernardo baethgen montenegro

    (30 de junho de 2018 - 03:52)

    gostei muito de seu post. muito mesmo. estou escrevendo um ensaio sobre o filme e sobre o livro. e acho que achei a resposta para o final do livro. é como se fosse uma chave.

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