“Vida e… morte? Esse é um tema um pouco tenebroso pro blog, não?” Você pode estar se perguntando. Se a resposta é positiva ou negativa eu não sei, mas é por causa deste pensamento que eu escrevo este post.
Se você é consumidor de cultura pop, seja através de filmes, séries, quadrinhos, livros ou afins, certamente você já teve a experiência de ver personagens importantes destes universos passando desta para uma melhor. Isto costuma ocorrer, assim como na vida real, com certa frequência. E se você é jovem, existem ainda grandes chances de que estas mortes tenham sido as primeiras de “pessoas queridas e próximas” que você vivenciou. Só espero que, para o seu bem, não tenha sido através de Game of Thrones ou Harry Potter, o que pode ter tornado essa sua experiência muito mais traumática.
Ok, mas e daí? Bom, a cultura ocidental (em especial a norte-americana, dona de basicamente todo o mundo do entretenimento) tem o costume de não encarar muito bem a morte e guardar uma visão negativa da mesma. Para nós ela é uma coisa terrível que nos leva a temê-la e por vezes ficar lamentando uma vida inteira por aqueles que já se foram. Obviamente, todo produto cultural vindo daí carrega esses pensamentos em sua essência, mas traz consigo outras consequências.
A animada comemoração mexicana do Dia de Los Muertos – retratada poucas vezes em filmes como “Viva: A vida é uma festa”, é uma das poucas exceções no ocidente. Fato que se deve à sua ligação com outra cultura, a indígena da América Central. E ainda assim, apesar de ter uma visão mais positiva do “outro lado”, voltada para festas e a interação dos vivos com os mortos, peca em alguns pontos como a história da “morte final” ou na fixação no imagético, usando fotografia como algo essencial para a lembrança continuar viva. De qualquer forma ainda é um enfoque melhor do que o das saudades eternas.
Feitas essas ressalvas, não é estranho vermos os personagens de nossas histórias favoritas temendo a morte (e nós com eles). O que pode fazer sentido quando estes são heróis com a missão de salvar o mundo que ficará indefeso sem eles, embora nem sempre seja essa a questão. Mais comum ainda são os casos daqueles que amam seus amigos e companheiros e não aceitam suas mortes, fazendo de tudo para trazê-los de volta à vida. Mas quem não faria o mesmo, não é? Já vimos esta trama em diversas ocasiões, tornando a ressurreição mais presente no pop do que em religiões.
Apenas para citar alguns casos temos o clássico retorno Superman, que voltou dos mortos trazido pelo seu próprio pai (que também estava morto!) antes que pudesse chegar à “luz”; Os infinitos retornos dos personagens mortos em Dragon Ball, que já estão tão acostumados que só jogam um “eu vou morrer ali rapidinho mas você me traz de volta com as esferas do dragão daqui a pouco”; A tentativa de trazer o namorado de volta no episódio “Be right Back” de Black Mirror – mesmo que de uma forma diferente; As indas e vindas de Jean Grey, a praticamente imortal Fênix dos X-men; E o comeback da caçadora de vampiros, Buffy, magicamente ressuscitada pela bruxa Willow. Este último, no entanto, com um grande diferencial que me fez ter um belo insight na época e rever minha visão sobre a morte.
Na série, Buffy morre no final da quinta temporada lutando com um vampirão, mas já no início da sexta temporada todos estão desolados e inconformados com sua ida e tentam um jeito de trazê-la de volta, por fim obtendo sucesso. “Oba, que maravilha!” você, assim como os amigos da caçadora, pode ter pensado, não é mesmo? Afinal, que beleza tirar as pessoas que você ama das terríveis garras da morte e botá-las neste belo mundo que vivemos, juntinho de nós de novo, né? Bom, parece que a própria Buffy discorda. Fato é que ela estava morta, mas passava bem. Na verdade ela tinha ido para o céu, o que ela confessa no famoso episódio musical (coisa que todos esses grandes heróis que sacrificam suas vidas para salvar o mundo merecem). Seu time que num impulso egoísta de tê-la de volta privou-a disto, arrastando-a de volta para a Terra.
Este enredo me tocou bastante, porque é na verdade o que acontece não só em basicamente toda cultura pop, mas nas nossas vidas. Encaramos a morte como algo negativo porque nos priva da companhia de pessoas que gostávamos. Não lamentamos por ela em si, afinal, se acreditarmos em vida depois da morte, ela provavelmente estará bem (pressupondo que seus amados sejam os mocinhos e não os vilões) e se não acreditarmos ela também não estará mal, apenas terá parado de sofrer – coisa que acontece com qualquer ser humano em maior ou menor grau.
Ou seja, passamos a desejar tanto a pessoa de volta que para nós ficarmos bem esquecemos do outro lado, de quem se foi. Claro que para histórias de entretenimento é muito mais interessante que seus personagens cativantes não morram, afinal eles não existem mesmo e vivos nos proporcionam o entretenimento que sempre gostamos infinitamente. O problema é a perpetuação na nossa mente da morte como uma coisa negativa, que só consegue ser superada quando os falecidos finalmente retornam à vida, sempre sem sequelas pelo retorno (tanto para eles quanto para quem o cerca) e levando uma vida normal.
Exemplificando bem essa questão, o conto “A ressuscitada”, de Emilia Pardo Barzan, conta a história de uma mulher que deitada em seu túmulo retorna à vida e volta para a casa. O que poderia ser um grande alívio, como sempre pensamos nestes momentos (e seus parentes imploravam em seu enterro), acaba sendo um pesadelo para a mesma, sempre tratada com estranheza e medo por todos após sua reaparição. Por fim ela decide voltar para o túmulo e permanecer morta, revelando como nosso sentimento egoísta de trazer de volta os mortos às vezes se assemelha ao de uma criança mimada que quer o brinquedo só porque não tem e quando o obtém acaba por jogá-lo fora.
Lógico que todos temos direito ao luto e sentir falta nunca será uma coisa fácil de superar. Mas tornar isso um fardo e perpetuar em nossa mente a falta de alguém nunca será a melhor maneira de enfrentar uma situação. Lembrar dos bons momentos e pensar no que aprendemos e vivenciamos com a pessoa de um jeito positivo é muito mais proveitoso. Isso não só nos fará perder o medo da morte como também nos fará enxergar com mais clareza as situações e o que é melhor para quem nos cerca.
Afinal, melhor uma Buffy depressiva do nosso lado ou uma Buffy plena no paraíso depois de ter cumprido sua missão na Terra?