Encerrando a série de posts sobre as emoções básicas, vamos de Alegria. Deixei a emoção favorita por último, mas é porque quero fazer diferente dessa vez. As outras 4 emoções sobre as quais já falamos (Tristeza, Raiva, Medo e Nojo) são normalmente vistas como negativas, indesejadas, e vimos aqui que elas tem suas funções importantes, e que o que deve ser evitado é o desequilíbrio, o extremo dessas emoções. E a Alegria? Bom, ela é a emoção básica mais buscada, por razões óbvias. Todos querem ser felizes e alegres o tempo todo, porque a sensação é muito boa. Mas será que devemos forçar a Alegria em nosso dia a dia o tempo todo? A solução pra tudo é sorrir? Nesse post vamos fazer o caminho inverso do raciocínio usado nas outras emoções: O que podemos identificar de ruim numa emoção agradável?
Primeiramente precisamos destacar o que a Alegria tem de bom, por mais óbvio que isso seja. Ela é motivadora. E, curiosamente, apesar de já se saber muito sobre as emoções que nos causam mal, não se tem muitas pesquisas focadas nas emoções agradáveis. Isso tem mudado recentemente, o que é bastante animador já que saber sobre o que nos faz bem é tão importante quanto entender sobre o que pode nos deixar doentes.
No filme Divertida Mente foi escolhida a Alegria para ser a protagonista das emoções, o que faz todo o sentido já que a história é centrada numa criança. Mas As emoções agradáveis são muitas, sendo a Alegria apenas uma das faces deste grupo.
Existem os Prazeres Sensoriais, que alguns autores não consideram emoções. Os 5 sentidos podem ser fontes de emoções agradáveis, sendo algumas praticamente universais, como o gosto doce, e outras aprendidas com o tempo, como os sabores condimentados. A Diversão é uma das emoções mais simples do grupo das agradáveis, ligada ao ato de ser entretido. O Entusiasmo vem da novidade, do desafio. O Alívio é quando aquilo que tinha despertado alguma emoção forte em nós, se aquieta. O Assombro é nosso encontro com a raridade, o incompreensível. E o Êxtase é a emoção que experimentamos no estado de arrebatamento, autotranscendência, pela meditação, sexo, experiências na natureza, etc.
O filme parece ter usado a Alegria para representar um pouco de todas as emoções agradáveis. Ela é o otimismo, o ânimo, a conciliação, mas também acaba sufocando outras emoções importantes, em especial a Tristeza, que é tão oposta à sua natureza.
Toda criança busca prazer, consequentemente Alegria, e todo o restante que se encontra como obstáculo nesse caminho pode ser frustrante. Por isso, vemos Riley usando a Alegria para lidar com todas as outras emoções. Vemos uma Alegria que centraliza a gerência de todas as emoções, absolutamente atarefada. Uma Alegria muitas vezes superficial, forçada. Porque, quando crianças, somos ensinados a comer mesmo com nojo, dormir no escuro mesmo com medo, falar baixo mesmo com raiva, e claro, engolir o choro mesmo quando tristes. A Alegria é a emoção básica que menos sofre retaliações da sociedade. Ela é tratada menos como uma emoção dentre muitas que nos ajudam, e mais como um objetivo em si. Estar alegre é o que mais importa, em qualquer situação. E é esse o grande problema da Alegria, tão bem representado no filme: ela simplesmente não dá conta.
A Alegria funciona bem enquanto não estamos passando por dificuldades. E poucas são as fases em nossas vidas mais cheias de dificuldade do que a adolescência. E é nessa fase que Riley passa por conflitos que começam a exigir dela uma maior cooperação entre as emoções, que é exatamente o que não acontece durante quase todo o filme. O esforço desmedido da Alegria em evitar a tristeza numa fase triste de Riley é justamente o que faz com que ela passe por tantos problemas, como a rebeldia, a apatia, e o isolamento.
Chegamos a ver uma cena muito didática na qual a Alegria desenha um círculo no chão e pede para que a Tristeza se mantenha dentro dele. É exatamente o que tendemos a fazer quando não queremos lidar com as dores: usamos a Alegria para confinar a Tristeza no menor espaço da nossa percepção possível, ocupando nossas mentes com festas, coisas boas, evitando o contato direto com os problemas e adiando a solução deles.
É só quando a Alegria percebe a importância da Tristeza, que Riley supera a fase complicada, dando vazão e atenção ao seu sofrimento e aprendendo a ter emoções mais complexas, misturadas, porque para certos momentos a solução não está em uma emoção apenas, mas em várias, combinadas. É o marco do início da maturidade emocional.
Sorrir em todos os momentos não é solução, é sintoma. Cada emoção tem sua importância, e é fundamental ensinar isso às crianças para que não cresçam reprimindo aquilo que pode ajudá-las a serem mais saudáveis.
E que um dia todos nós entendamos “que rir é bom, mas que rir de tudo é desespero”.