P!nk e um papo sobre idade

Daí que rolou essa treta:

Um hater postou no Twitter que a P!nk está tão velha que deveria ser chamada de “Purple”. Dãã. Ela deu a melhor resposta: “Sou da mentalidade de que é uma bênção envelhecer. Que se seu rosto tem linhas ao redor dos seus olhos e boca, quer dizer que você riu muito. Eu rezo pra parecer mais velha em 10 anos, porque isso vai significar que estou viva. Você deve ser de Los Angeles. Bem, ainda tem algumas poucas pessoas no mundo que escolhem envelhecer naturalmente. E eu ganhei cada minuto dos meus 38 anos. E como está sua aparência? Porque eu nunca tinha ouvido falar de você até você colocar meu nome na sua boca. Vou chamá-lo de Pequeno troll roxo.” Resposta lacradora que me fez começar a pensar nesse lance de idade.

Muito tem se falado e a gente vem conseguindo alguns avanços (longe do ideal ainda, mas enfim) quando o papo é sexismo, ou racismo, por exemplo. Mas não vejo muita preocupação em discutir a discriminação etária. Se a P!nk, que tem 38 ANOS, tá passando por isso, imagina a galera que já tá nos 70, 80, 90 anos? Não tem que rolar um papo mais sério sobre isso, gente?

De onde vem esse desprezo pelos “mais velhos”? Num sistema onde a palavra de ordem é consumir, não importa se forem celulares, carros, ou roupas, o culto ao novo fica bem aparente. Não trocamos de telefone porque o nosso parou de funcionar, mas sim porque foi lançado um modelo mais recente – que faz basicamente tudo o que o nosso já fazia – mas é novo! Aliáaas, um parêntese sobre a sociedade de consumo:

httpssss://www.youtube.com/watch?v=e705FJLA5lo

“Compra-se e descarta-se. Mas o que estamos gastando é tempo de vida. Quando compramos algo, não compramos com dinheiro, mas sim com o tempo de vida que tivemos que gastar pra ter aquele dinheiro. Mas tem um detalhe: a única coisa que não se pode comprar é a vida. A vida se gasta. E é lamentável desperdiçar a vida para perder a liberdade”. Pisa menos, Mujica!

Voltando à história da obsessão pelo novo. Não é de se admirar que numa cultura que prega o descarte de produtos, esse raciocínio seja levado pras pessoas. As crianças e os jovens são como os últimos lançamentos, com suas aparências provocativas, pensamentos desafiadores da ordem estabelecida, cheias de energia, sem bugs, nunca sofreram quedas e não têm arranhões na tela. Isso é ruim? Óbvio que não, é maravilhoso. Nada como ideias que chegam pra questionar e superar conceitos antigos, mas não necessariamente adequados. O problema é quando isso é culturalmente atribuído a esse grupo e exclusivo dele. Inovar, criar, ousar, parece só ser aceito até uma determinada fase da vida.

Pra enxergar isso é só dar um passeio rápido por qualquer empresa privada de médio ou grande porte. Quantas pessoas com uns 45 anos você vê trabalhando numa área de comunicação, por exemplo? Com uns 50, 55? É raro, né? Porque elas são incapazes, ou menos criativas, ou menos competentes? Não! Simplesmente porque existe um acordo implícito de que simplesmente não vamos considerar currículos de quem já tem mais experiência. E é isso, tá tudo certo, segue o baile.

O raciocínio não se aplica só pro mercado de trabalho, mas se extende pra todas as relações: é difícil ver, por exemplo, grupos de amigos com idades que não sejam muito homogêneas. Tenho a sorte de ter alguns amigos na casa dos 50 e 60 anos, e são algumas das pessoas mais divertidas que conheço. E não é porque elas mantêm uma “mente jovem” nem nada disso. É que elas são, em essência, abertas, curiosas, com posturas positivas diante da vida. E isso independe do número de anos que elas somam.

O engraçado é que a parada é tão sólida que as próprias pessoas se encaixam no papel que foi dado a elas sem questionar. A partir de uma certa idade começam a usar aquelas frases feitas tipo “isso não é do seu tempo”, não tenho mais idade pra isso” etc. E vão se excluindo sozinhas, aceitando e, pior, acreditando que elas tem mesmo cada vez menos pra contribuir. Acham graça de piadinhas depreciativas com o assunto, arrumam um jeito de levar a coisa com bom humor, afinal é só que resta. Será?

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Pra fazer rodar ainda melhor essa engrenagem, entra também a ditadura da beleza. Pra ter alguma importância tem que ser bonito, e o bonito não pode ter ruga, nem cabelo branco. Doença então, nem pensar. Se você começou a apresentar algum desses “males”, pode ir se recolhendo à sua insignificância até ficar invisível. Afinal, nada pior que gente feia e velha por perto, né?

Não, não, povo! Não é pra aceitar esse discurso perverso. Quanto conhecimento se perde com essa mentalidade tosca! Vou usar como exemplo minha avó. Ela tem 91 anos e, de uns tempos pra cá, comecei a trocar muita ideia com ela. Apenas descobri que ela é um computador ambulante: guarda na cabeça centenas de poesias lindíssimas que aprendeu quando morava em Portugal, e ninguém saberia se não tivessem parado pra ouvir o que ela tem a dizer. De nossas conversas já saíram 2 livros de poesia, e ela quer lançar mais.

Ela também me fala muito das experiências que viveu, boas e ruins, e de como se posicionou diante delas. Conhecer o passado te dá a chance de repensar, modificar, ou apenas estar ciente de padrões de comportamento que herdamos e, se não sabemos sua origem, apenas reagimos a eles sem estar conscientes. Esse é só um exemplo familiar e pessoal, mas essa troca pode rolar entre amigos, colegas de trabalho, e ampliar nossas oportunidades de crescimento em várias áreas.

Então bora parar com essas chatices: você crianço vai mostrar uns memes pra mamãe e pra titia e deixar elas participarem do seu universo. Você que tá se achando velho vai ouvir umas músicas da galera que tá se lançando agora (mas não vale dizer que “no seu tempo era muito melhor”). E vamo apagando essas linhas divisoras entre as gerações, porque isso aí é mó ideia errada. 😉

Post Author: Layllis

2 thoughts on “P!nk e um papo sobre idade

  • Caró

    (21 de maio de 2018 - 15:58)

    Cliquei no link, assim do nada, fui lendo e pensando “nossa que texto mais ótimo”. Sabe, quando a cada frase você mentalmente diz “Sim, é isso” aí inicia uma amizade com o escritor? Só falta passar um cafézinho pro próximo parágrafo?

    Niqui chega no final o texto é da Lalá muito bom me sentir velha assim

    (E ao mesmo tempo bem criancinha com muita dificuldade de resolver esse captcha matemático, errei 3 vezes, ou talvez 4)

    • Layllis

      (23 de maio de 2018 - 19:17)

      Ahhh, que lindo! Obrigada, Caró! <3
      (e eu também sempre respondo/erro/reclamo/desisto/respiro/resolvo o captcha, hahaha)

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